Grêmio Libertador

Carta aberta pra Placar e correlatos

O processo de conscientização, como já escrevi aqui hoje, é repetitivo. Ele também é lento e trabalhoso. E é muito mais fácil de ser destruído do que construído. E, antes de publicar qualquer coisa, precisamos pensar se estamos cooperando com esse esforço. Não creio que foi o caso da escolha de vocês e outros veículos no dia de hoje. Por isso resolvi usar esse espaço para manifestar alguns questionamentos.

Não sei se vocês nos conhecem. Somos também parte da torcida do Grêmio. Eu, que escrevo agora, os outros Gremistas Libertadores e os nossos leitores. Se vocês tiverem um pouco de paciência para buscar aqui nos arquivos dos sete anos de blog, verão que a torcida do Grêmio é um coletivo de várias cabeças que pensa de forma particular. E que, de forma alguma, eu poderia fazer uma média e dizer: esse é o torcedor do Grêmio Libertador, ou esse é o blogueiro do Grêmio Libertador. E mesmo para fazer uma média, eu precisaria estabelecer critérios. Assim, gostaria de saber: quais são os critérios que vocês usaram para dizer que eu sou parte da torcida mais racista do Brasil? Como é que se infere esse título? É pelo número de denúncias? Pois eu tenho uma novidade pra vocês: existir mais denúncias aqui do que no resto dos clubes do Brasil também é sinal de que não se aceita mais isso aqui. Não é mais normal e aceitável, como outra hora. Quantos ainda silenciam?

Mais uma campanha institucional “chata” do Grêmio, em 2007. Foto do Grêmio.

Não haver denúncias no Flamengo não é sinal direto que não existe racismo no Rio de Janeiro. Nem que possa se fazer um ranking das torcidas de clubes brasileiros mais racistas em função desse número. Muito menos dos clubes mais relapsos em relação a isso. O que é fazer menos: um vídeo chato para colocar na Arena (o Grêmio instituição já fez outros “vídeos chatos”, diga-se) ou simplesmente nunca tocar no assunto, como o Goiás, por exemplo? Há um problema histórico na sociedade. O próprio futebol veio pro Brasil seis anos depois da “Lei Áurea”. Colocar a pecha apenas em uma torcida não faz com que ela, injuriada, esqueça de se auto-criticar e passe a se achar ofendida? Como podemos ser, ao mesmo tempo, a torcida mais racista do Brasil se é uma minoria, como diz nos textos? Quanto é “uma minoria”? Aquelas pessoas de Caxias do Sul, aqui no Rio Grande do Sul, que discriminaram os ganeses é formada só de torcedores do Grêmio? Não gostam de futebol, de repente (se gostassem, eram gremistas). Ou o caso do colorado aquele que falou um monte de asneiras sobre os nordestinos faz da torcida colorada a mais xenófoba do Brasil? Por acaso o Antônio Carlos era jogador do Grêmio quando ofendeu ao vivo o Jeovânio em 2006? Ou melhor, os torcedores do Grêmio aplaudiram, né? Assim como botaram bananas no carro do Márcio Chagas da Silva ano início do ano. Se vocês querem eleição por denúncias, de repente, perguntem pro Felipe, do Flamengo, se ele lembra de já ter sofrido o mesmo que o Aranha.

O racismo é um problema sério demais para chamadas caça clique. Tem racismo no Grêmio porque ele é uma forma particular de organização social, porque existe racismo no Brasil todo. Num estado que tradicionalmente segrega. Mas podemos dizer que o Rio Grande do Sul é o estado mais racista do Brasil? Seria correto? Com base no quê? Em 2010, de 2035 mortes por assassinato no estado, 633 eram negros. Em São Paulo, de 5529, quase metade (2319) eram negros. O RS é menos racista que SP? Aqui se hostiliza, em São Paulo mata? A torcida do São Paulo e do Palmeiras, por exemplo, chamando os corintianos de gambá se referem só a cor do uniforme? Ou os urubus do Flamengo? Aliás, se somos apenas a oitava torcida em número no Brasil, haja racista para ser a campeã nacional. Mais uma vez: de onde veio esse dado?

Temos muitos racistas na nossa torcida. Isso é gritante todas as vezes que fazemos postagens aqui contra o uso da palavra macaco para se referir aos colorados (como fazem os torcedores do Guarani com a Ponte Preta – gremistas, eu presumo). É algo que nos preocupa e tem preocupado diversos outros gremistas. Aliás, desde que passei a frequentar o Olímpico como sócio assíduo, em 2006, a quantidade de babacas imitando macacos diminuiu muito. Ainda existe o péssimo exemplo das letras das músicas – e, espero, a posição da Torcida Jovem seja exemplo pro estado inteiro. Porém, preciso perguntar: colocar tudo na conta da torcida do Grêmio (afinal, é a MAIS RACISTA DO BRASIL) ajuda em quê na luta contra o racismo? Como taxar a torcida com essa alcunha ajuda a combater o racismo dentro da própria torcida? Perdi essa parte. Gostaria de esclarecimentos. Se vocês realmente se preocupam com a questão do racismo, é bom esclarecer.

Em suma: NO QUE “ELEGER” A TORCIDA MAIS RACISTA AJUDA A COMBATER O RACISMO?

 

Até aqui no site mesmo amadurecemos as nossas posições durante os anos. Não dói. Façam o mesmo. Deixem de reforçar estereótipos que menos do que ajudar, só atrapalham. Precisamos de ajuda para extirpar o racismo – e a homofobia, misoginia e outras podridões naturalizadas no futebol. Seria bom contar com vocês. Se  quiserem mesmo ajudar, pensem um pouco.

Saludos,
Fagner – blogueiro do Grêmio Libertador

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